28.11.08

pensar entre devaneios e rodopios

Descobri que giro melhor do que penso. Será?
Sonhei que eu era bailarina. Girava pra lá e pra cá num filme de Godard e suas cenas vibrantes. Nada permanecia. Meus passos só acompanhavam a minha emoção. Minha vontade de flutuar não me deixava acordar. Tudo tinha movimento, como os desenhos da minha irmã, traçados por riscos ilusórios e desgovernados.
No sonho, eu fazia par com o Fred Astaire. Mas... logo... me descuidei sem querer. Pisei no pé do rapaz. Ele olhou para mim, pediu licença e saiu. Fiquei envergonhada. Despertei.
E, lembrei que meu lugar era sentir o momento de pensar, mesmo neste sonho de dançar em imagens suntuosas, formado por movimentos aleatórios e inconscientes.
Então, me vi apaixonada pelo movimento de um pensamento cheio de figuras caóticas: um descompasso sem começo, meio ou fim.
Assim! Decidi! A minha Filosofia, a partir de hoje, será escrita como se estivesse numa ciranda. Pra lá e pra cá. Pra cá e pra lá. Sem perder o ritmo, quero falar do movimento que não pára, mesmo para quem não sabe dançar.



19.11.08

dia meio comum

Tudo parecia igual. Levantou às 7, pulou da cama, tomou banho, água pro café no fogo e alguns pensamentos soltos. Tudo parecia mais ou menos igual. Comeu o pão amanhecido mergulhado no café forte com um pouco de leite, folheou o jornal, riu pro gato e empacotou-se em sentimentos matinais. Tudo começava a parecer bem diferente. Fez a lista de pendências do dia no papel da padaria, ajustou-se na calça jeans, blusinha estampada por debaixo da jaqueta, suspirou em silêncio a ausência dele. Tudo era diferente. Correu para o ponto de ônibus, esqueceu os óculos escuros, deu bom dia para o porteiro do prédio vizinho, chorou uma lágrima de angústia. Nada era igual. Sentou na mesa para começar o dia de trabalho, tomou mais um café, da Dona Severina, leu os e-mails, refletiu um amargo gosto de perda. Aquietou-se! Cantou a música do rádio enquanto criava o logo para uma empresa de lingerie, conversou com o colega de trabalho sobre o filme que tinha visto na noite passada, sentiu o inexistente e reconheceu a falta de cor nas lembranças que ainda os unia. Celular tocou. Era o despertador: fim do expediente, hora de encerrar o dia.

[imagem: "Chuva", Oswaldo Goeldi ]

9.11.08

Recortes de Jornal


Erámos como dois animais, com os sentidos aguçados. Sentia teu cheiro em todo meu corpo descoberto, sentias meu gosto nos teus lábios, na tua língua macia. Misturados sob revistas e jornais, ilumindos apenas pela lua cheia que entrava pela janela daquele lugar oculto. Enxergava todas suas cores, vibrantes. Me enxergava em preto e branco, dizia. Nos divertíamos com frases feitas, notícias ultrapassadas, fotos, figuras. Nossos corpos colavam de suor. Gostava que colasse recortes pelo teu corpo nu. Falavamos ao pé do ouvido. Sentia sua respiração profunda e meu coração acelerado. Ficavamos cada vez mais sujos, coloridos, com os corpos quentes, excitados. No último trago de cigarro: Boa Noite, meu amor!

Maria Claudia Machado

5.11.08

para um 2008 que se vai... fica saudade de futuro... e vontade de presença!



*vídeo: Poema, por Ney Matogrosso

"Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo
E procurei no escuro
Alguém com seu carinho
E lembrei de um tempo...

Porque o passado me traz uma lembrança
De um tempo em que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via um infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim (que não tem fim)

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás"

(Poema - Cazuza e Frejat)